Influenciado por nomes como Geovani Martins e Conceição Evaristo, autor carioca escreve histórias inspiradas no cotidiano urbano e violento do Rio de Janeiro
Livro de estreia do professor carioca Thiago Oliveira (@o.thi.agoliveira), “Brutos e insensíveis” reúne onze contos curtos que expõem como a masculinidade e a violência se entrelaçam no cotidiano de uma cidade como o Rio de Janeiro. Publicado pela Escaleras (71 pág.), a obra conta com a quarta capa assinada pela escritora, professora de Escrita Criativa e vencedora do 6º Prêmio Kindle de Literatura, Vanessa Passos, e orelha assinada pelos escritores Michel de Oliveira e Bruno Ribeiro.
“O autor apresenta várias facetas de um Rio de Janeiro que vai além de Copacabana, desce as ladeiras, percorre becos e vielas, espia da janela dos prédios e mostra a intimidade, as dores que vivenciam esses protagonistas” afirma Vanessa. Essa abordagem da cidade como um cenário que se faz presente quase como um personagem, sendo um dos elos entre as histórias, veio provavelmente de algumas referências que o autor lista como suas, como Geovani Martins e Conceição Evaristo. Além deles, James Baldwin e os escritores brasileiros Vagner Amaro e Michel de Oliveira são parte da filiação literária de Thiago.
A presença da cidade e do cotidiano como entidades opressoras vem também do próprio universo do autor: Thiago escreve geralmente no celular, quando está em trânsito, circulando de ônibus pelo Rio. “Sempre criei histórias. Mas nunca soube que poderia ser escritor. Trabalhando desde quinze anos eu demorei muito tempo até descobrir quem eu era e as coisas que queria”, conta o autor.
Um Rio de Janeiro fora dos cartões postais
Para ele, o mote de “Brutos e insensíveis” é tratar das diversas formas de violências praticadas e sofridas pelos homens na sociedade brasileira. A masculinidade tóxica é o fio condutor dessas narrativas que se constroem a partir das notícias e temáticas que tocam Thiago em seu cotidiano, como violência doméstica, abuso policial e privilégio branco: “Sei bem como é ficar cara a cara com o caveirão e não saber o que fazer. A polícia carioca é totalmente truculenta e genocida. Acho que todas essas questões me tocam e me incomodam tanto que acabam não sendo uma escolha de tema, mas uma consequência.”
O desejo de escrever esses contos surgiu durante a pandemia, quando o autor constatou que “homens medíocres são extremamente perigosos”. Segundo ele, essa reflexão veio da conclusão de que a política bolsonarista abriu portas para homens de “ego ferido” e isso fez com que a violência contra a mulher, a homofobia, o culto às armas, a intolerância religiosa e a violência policial voltassem a ser vistos de maneira naturalizada, em meio a uma ideologia autoritária agressiva. “Os homens que compõem este livro odeiam mulheres, odeiam outros homens e provavelmente odeiam a si mesmos”, pontua.
Trecho do livro:
O tiro tava comendo solto quando o ônibus disparou. Ouvi mesmo com fone nos ouvidos. Ninguém se mexeu. Parecia trilha sonora do trajeto. O incômodo de repente vira parte do cotidiano, mas ninguém percebe.
(pág. 54 de “Brutos e insensíveis”, de Thiago Oliveira)