Poeta e performer retorna à sua ancestralidade canavieira e escreve sobre o peso do sentimento de não ter família e desconhecer o passado em “Memória tem Águas Espessas”
Luna Vitrolira (@luna_vitrolira) é poeta, cantora, compositora, atriz, pesquisadora, palestrante e Mestra em Teoria da Literatura, com ênfase em oralidade e poética das vozes. Com um trajetória renomada — Luna foi finalista do Prêmio Jabuti em 2019 e já foi jurada do prêmio Jabuti e do Oceanos — a autora lança, pela editora Diadorim, “Memória tem Águas Espessas” (120 pág.), livro que permeia os temas da memória, retorno ao passado ancestral, perdão e cura.
Os eventos de lançamento estão previstos para acontecer em Pernambuco e São Paulo a partir de setembro, quando também devem acontecer vivências em escolas pernambucanas para alunos a partir do nono ano, como ação de contrapartida do edital do Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura). A escritora deve passar por escolas de Recife e região metropolitana, além das cidades Tracunhaém, localizada na Zona da Mata, Caruaru, no Agreste, e São José do Egito, no sertão do Pajeú. Cerca de 100 exemplares da obra também serão doados para instituições culturais, sociais e educativas do estado.
“É de extrema importância levar a literatura contemporânea para a sala de aula, conversar com os jovens sobre a nossa história, região, memória e ancestralidade do povo negro e originário através da poesia, de modo que possam se reconhecer como parte de seu próprio território”, reforça Luna.
Conheça “Memória tem Águas Espessas”
Trata-se de um longo poema narrativo escrito a partir de uma experiência imersiva em busca de sua ancestralidade canavieira, natural da zona da mata de Pernambuco. Uma parte apagada da sua história e vida sobre a qual nunca teve conhecimento ou contato. Luna escreve sobre o peso do sentimento de não ter família e desconhecer o passado, o que é comum na vida das pessoas brasileiras, devido ao processo de colonização e ao sistema escravocrata que dispersou a genealogia do povo negro e originário.
Para Luna, essa investigação, além de ter um tom pessoal, também levanta questões sociais. “O meu ponto de partida é a minha vivência, mas essa é a história de muitas pessoas nesse país e mundo”, afirma a escritora. “Sofremos a dispersão dos nossos familiares durante a escravidão, com o trafego ilegal de pessoas. Fomos vendidos, perdemos contato, perdemos a relação e a possibilidade de viver esse afeto familiar, porque fomos separados. De alguma forma isso continua, seguimos nos desintegrando, sem saber quase nada sobre nosso passado.”
Luna traz o cenário canavieiro da Zona da Mata e questiona a manutenção do sistema colonial na cultura da cana-de-açúcar até os dias de hoje. A poeta faz o trajeto de volta, de retorno ao território em busca dos ossos da família para curar, se libertar e libertar seus ancestrais ainda presos, enterrados vivos, sob o mar de cana.
Escrita pela vivência e renascimento
Luna é natural de Recife, cresceu na na cidade de Paulista/PE. Seu início com a poesia começou no sertão do Pajeú. Nascida Gabrielle Lira, Luna começou sua trajetória artística aos 15 anos, na cena da poesia falada. “A poesia me ensina a existir nesse mundo”, diz, explicando que, para além do texto, a poesia é a forma que ela encontrou de se situar e de se conectar tanto com o mundo quanto com a espiritualidade.
Em sua poesia, Luna Vitrolira elabora e revela processos de autorreconhecimento e autoconsciência da própria história, imagem, origem, território, ancestralidade, herança imaterial e simbólica. “Na adolescência comecei a perder proximidade com familiares e sofri o abandono da paternidade. Passei muito tempo ruminando o peso das ausências e tive que aprender a perdoar, para não adoecer de raiva, frustração, revolta”, conta a escritora, que então começou a entender que precisava canalizar essa energia para viver uma história diferente. “Passei um tempo analisando o que herdei de bom que preciso manter, aprimorar; e o que herdei de ruim que preciso romper e curar. É um processo de autoconhecimento e autoconsciência”, evidencia. A partir desse processo, a autora decidiu ir em busca de sua história genealógica materna a fim de conceituar, para si mesma, o significado de “família”, o que resultou no livro.
Dentre os escritores que influenciaram“Memória tem Águas Espessas”, Luna destaca, em maior parte, escritoras negras como Conceição Evaristo, Noémia de Souza, Joice Berth, Grada Kilomba, entre outras. Ela ainda acrescenta artistas da música, contando que escreveu ouvindo Nina Simone, Naná Vasconcelos, Lucas e Orquestra dos Prazeres e Serena Assumpção.
Luna Vitrolira e a poesia que ensina a existir
Luna estreou na poesia em 2018, com o livro “Aquenda – o amor às vezes é isso” (Selo Livre), que foi finalista do Prêmio Jabuti em 2019. A obra se transformou em um projeto transmídia, abrangendo os campos da literatura, da música e do cinema, com livro, disco e filme homônimos. Ao longo de sua carreira, já se apresentou em eventos literários importantes, como a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), a Bienal do Livro de Pernambuco e a Balada Literária.
É também idealizadora e manager do projeto “Mulheres de Repente”, através do qual apresenta a Mesa de Glosas do sertão do Pajeú – PE, modalidade de poesia de improviso metrificada. Foi jurada de dois grandes prêmios de literatura nos anos de 2022 e 2023, o Prêmio Oceanos e o Prêmio Jabuti, na categoria poesia, e integra a exposição Falares no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo. Participou de eventos como poeta, MC e CMO da 99jobs: CSW NY (Evento do Pacto Global- Rede Brasil, na sede da ONU nos Estados Unidos – 2024) e Ambição 2030 (Evento do Pacto Global – Rede Brasil, em SP – 2024)
Luna ainda é CMO da 99Jobs, facilitadora, entusiasta e colaboradora de planos, projetos e programas que têm como meta construir políticas de equidade de gênero e combate ao racismo institucional, com foco em diversidade e inclusão, e atua em programas de formação e acolhimento, voltados para as juventudes das periferias, em comunidades, escolas e colônias penitenciárias.
Adquira “Memória tem Águas Espessas” pelo site da editora Diadorim:
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