Queremos mais temporadas de Cangaço Novo

Audiovisual

Olha, eu não sei nem como escrever sobre Cangaço Novo de tão impactada que eu fiquei ao assistir o conteúdo dessa série. Talvez seja uma necessidade de deglutição das emoções. Não sei ao certo. O que eu sei é que precisamos dessa confirmação de próximas temporadas JÁ!

Todos estamos cientes de como funcionam os streamings (?), ainda que não tenhamos tantos detalhes assim. O fato é que para ter continuidade (longevidade), uma produção é obrigada a ter alta performance de streams. Dessa forma, as plataformas enxergam mais cifras onde a gente vê episódios inéditos para maratonar.

A série

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Com 97% de aprovação no Rotten Tomatoes, nota 8,8 no IMDB e 10 lá em casa, a série Cangaço Novo, disponível no Prime Vídeo, conseguiu teletransportar pra dentro do catálogo um pedaço da vida nordestina tal qual a gente conhece. Como alguém que nasceu no Piauí, um dos nove estados da região, parecia que eu tava vendo uma cena genuína do meu cotidiano, que de repente foi invadida por muita ação e altas doses de choque de realidade. É o retrato de um nordeste vivo, pulsante, cheio de gente inteligente e empenhada em fazer tudo pelo coletivo.

Entretanto, antes de alcançar esse status de síntese do que é pertencer e entender essa região, acompanhamos a jornada pessoal dos protagonistas na busca por eles mesmos individualmente, tal como em qualquer obra audiovisual. A maneira como eles trilham essa jornada, em contrapartida, não é nada comum. Os irmãos Vaqueiro são muito reconhecíveis em pessoas que a gente lembra das nossas relações, daquelas cidadezinhas do interior profundo, mas as dores que eles lidam são tão profundas que talvez não seja possível acessar todas as camadas necessárias para, de fato, afirmarmos que conhecemos.

No início, Ubaldo já apresenta aquele sentimento de revolta que é bastante característico de quem vive numa realidade adversa e desigual. É demitido do banco em que trabalhava e fica inviável custear o tratamento do pai adotivo, internado em estado grave. Num ato de desespero, na falta de descrição mais apropriada, ele parte numa missão completamente tresloucada rumo ao Ceará para reivindicar uma herança do pai biológico. O que ele não sabia, ou não lembrava, era que o teor desse espólio familiar ia muito além de uma propriedade de terra.

Chegando lá encontra as irmãs, Dilvânia e Dinorah, que também estão enfrentando as batalhas duras que são muito cotidianas para mulheres nordestinas: basicamente lutar para serem respeitadas num ambiente inóspito e nada amigável. Não só pela presença majoritária de uma lógica patriarcal severa, mas pelas adversidades econômicas e políticas. O erro de Ubaldo é julgar que seria simples voltar para São Paulo com a situação litigiosa resolvida. É aí que começa a ação.

Dinorah trata logo de explicar as regras do jogo. Ela manda em tudo por ali. Sempre peita desafios e desafetos. Não iria aceitar um forasteiro chegando pra bagunçar a ordem, mesmo ele sendo sangue do seu sangue. Enquanto explica ela explode na tela. Nunca vi uma personagem que represente tanto o modo como as mulheres nordestinas agem e são. Mesmo as que guardam o ímpeto e a raiva dentro de si não têm como negar que são um pouco como Dinorah. O que fica na superfície é ainda mais fácil de tatear. A força que se mostra quase indomável. O espírito que não se quebra nem com a presença do amor.

Fiquei satisfeita demais com as escolhas do roteiro que não fragilizaram a personagem nem no maior momento de dor. Não é pra reforçar estereótipos de que a mulher precise ser forte em todas as ocasiões, é sim para ela não perder sua essência, não se submeter ao masculino que é o que acontece de forma padrão nas relações reais e audiovisuais. Ela não esmorece e não se modifica por Lino – o homem que ama. Ele nem ia querer isso, aliás. Isso foi muito bonito de ver. O amor na forma bruta mesmo. Sem vaidades, sem maquiagens, sem mudança de visual. Esse amor que está por aí, acontece e é possível. Mas, que tudo que nos cerca prefere nos fazer acreditar que não. Que só um tipo de mulher é digna de amor: a que não é zangada.

Dinorah e Lino (meu casal demais)

Dilvânia é mais serena. É ela que une os rivais. Aos poucos vai aproximando Dinorah e Ubaldo com sua linguagem no olhar. Mesmo sem falar ela também não se cala perante as injustiças que observa ao seu redor. Herdou a obstinação da família e, apesar de não utilizar as mesmas armas dos irmãos, tem papel determinante nos rumos da trama. Essa trinca apronta e ganha contornos admiráveis ao longo dos oito episódios da primeira temporada. A sequência em que Dilvânia insiste na pista da irmã desaparecida e guia Ubaldo até encontrarem Lino, e depois Dinorah, é uma pérola. Prepare suas emoções.

Em resumo, a série mostra a saga de um grupo de ladrões de banco de um jeito que o cinema americano nunca vai superar. Concordo com um comentário que li num vídeo do youtube, acho, “se fosse uma série de língua inglesa os protagonistas ganhariam todos os prêmios que existem”. E com razão, pois as atuações são de cair o c* da bunda de tão boas. Allan Souza Lima (Ubaldo/Amaro) eu já acompanho o trabalho tem um tempo e sou fã. É ator profundo. Alice Carvalho (Dinorah) tô conhecendo agora e já considerando pacas! Que preciosidade a construção dessa personagem. É uma força da natureza. É água na seca, é chuva no sertão. Thainá Duarte (Dilvânia) também deu o nome demais, tanto que eu nem me toquei que já tinha visto o trabalho dela em Aruanas, série da TV Globo em que ela interpreta uma ativista de causas ambientais.

Dilvânia (Thainá Duarte), Dinorah (Alice Carvalho) e Ubaldo (Allan Souza Lima)

Acho que enumerei boas razões pra renovação da série sem mesmo falar de aspectos mais técnicos que eu derraparia em tentar explicar. Você só precisa saber, se ainda não assistiu, que é tudo muito lindo, muito bem filmado e dirigido. Quando a gente termina, além do sentimento que de querer assistir tudo de novo, a gente torce pra que o mundo inteiro possa ver essa belezura também. Dá muito orgulho saber que este trabalho foi todo pensado e criado por aqui. Que o hype cresça e que a gente ainda possa acompanhar muitas aventuras desses irmãos que boa parte do Brasil já aprendeu a amar.

Faça sua parte e divulgue pra que todo mundo que ainda não viu possa conhecer. Os profissionais do audiovisual brasileiro merecem.

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